Amantes dos animais sofrem desde a infância ao vê-los abandonados. Muitos querem adotar todos os cães sem lar que existem! Mas a realização desse sonho passa por várias dificuldades. Consegue-se abrigar uma quantidade ínfima da população canina abandonada. Cães alojados juntos se envolvem em brigas que podem acabar em morte. Falta verba. Surgem problemas com vizinhos. Há dificuldade para conseguir um lar para os cães, etc. Sem ter uma idéia clara das dificuldades, dos problemas e das limitações, a realização desse sonho pode se transformar facilmente em pesadelo para todos os envolvidos.
É comum encontrarmos abrigos de cães em péssimas condições, sujos, com fezes e urina por toda parte, com excesso de cães para o espaço, com animais doentes sem tratamento e até sem ter o que comer. A princípio parece estranho, pois a idéia é salvar os animais e lhes dar vida digna. Portanto qual a explicação? Aprendi que a maioria das pessoas que investe no sonho de ter um abrigo sofre tanto em ver qualquer animal abandonado que não consegue deixar de resgatá-lo. A dor e a emoção dominam a lógica e mais um cão é levado para o abrigo. O raciocínio é que onde comem cinco, comem seis! Como o número de cães abandonados no Brasil supera a capacidade de qualquer abrigo, o "coração de mãe" (sempre cabe mais um) se torna uma armadilha. E, aos poucos, a superpopulação do abrigo passa a ser vista como normal.
Para piorar, quanto mais deteriorado for o estado dos cães no abrigo, mais difícil fica encontrar quem os queira adotar. Um local fedido, com cães doentes e machucados, pode repelir os interessados. O próprio responsável pelo abrigo fica constrangido e evita visitações. Às vezes, a pessoa que quer adotar um cão fica impedida de interagir com ele, pois as chances de saírem brigas com os demais são enormes.
Em minhas visitas a abrigos de vários países, constatei nos "melhores" algumas semelhanças na maneira de agir e de pensar dos proprietários. Esses abrigos são tratados como "empresas", com diretrizes e missão bem claras. Atitudes que desviam a empresa da sua missão devem ser descartadas, pois podem prejudicar o projeto ao longo do tempo. A frieza para abrir mão de "salvar" mais um cão geralmente não combina com o temperamento dos fundadores do abrigo. Por isso, essas pessoas se associam a "administradores" que não podem perder de vista a qualidade mínima de vida desejada para os animais do abrigo. Os parâmetros de bem-estar, de população máxima, etc., devem ser fixos, caso contrário os limites se perdem aos poucos diante das novas situações. Entender a nossa fragilidade emocional e adotar atitude preventiva é fundamental para o sucesso do abrigo.
Normalmente é consenso que os abrigos devem ser um lar provisório para animais com chance de ser adotados. Portanto a missão desses estabelecimentos é arrumar lar para o maior número possível de cães. Claro que não adianta o cão ser adotado para logo depois ser abandonado novamente ou ter vida pior do que a que levava no abrigo. Com o objetivo primordial claro, outras decisões ficam mais fáceis do ponto de vista lógico, o que não significa que a parte emotiva da sociedade não sofra cada vez que for impedida de trazer mais um cão para o abrigo.
Para conseguir maior número de adoções definitivas, os abrigos têm avaliado o temperamento e o comportamento dos cães e dos futuros proprietários, além de instruir estes últimos sobre cuidados básicos e problemas comuns. Pessoas que não têm firmeza, por exemplo, são aconselhadas a adotar cães com quase nenhuma tendência à agressividade. Em alguns lugares, como no abrigo Battersea, na Inglaterra, adotar um cão é semelhante a passar por uma entrevista de trabalho.